Sim, que dos fracos - partido socialista português - não reza a história. A história
fez-se portanto no Connecticut e foi de novo adiada em Portugal. Lendo de relance o que foi escrito nestes últimos dias, ainda pasmo e sobretudo me aborreço com a quantidade de palermices repetidas. Nota-se um claro menosprezo pelo tema do casamento entre homossexuais, que impede o mínimo esforço mental em boa parte dos cronistas e blogueiros da praça, indiferentes portanto à falta de um mínimo de coerência ou verdade nos seus escritos. O que importa é de algum modo aliviar a sua homofobia, essa sim visceralmente sentida.
Seja como for, perante o desfile de disparates sinto-me obrigado a listar uma série de desmistificações casamenteiras. Não chegam a tempo do debate, mas aqui ficam para uso futuro.
1) Não foi a igreja católica a inventar o casamento, ele já existia milénios antes do mito do pescador palestiniano - a.k.a. Jesus - se popularizar e originar diversas seitas, entre as quais a com sede em Roma.
2) O casamento civil é anterior ao casamento católico, já havia casamento civil p.ex. na Antiga Roma ou Antiga Grécia.
3)
O casamento civil do estado português tem 140 anos e foi criado entre enorme polémica provocada pelos lóbis ligados à igreja católica. Até aos dias de hoje um católico casado apelas pelo civil continua solteiro aos olhos da igreja, que não reconhece o dito casamento, apesar de se preocupar muitíssimo com a mínima alteração legislativa do dito, seja divórcio ou acesso ao mesmo por casais homossexuais.
4) Casar não fertiliza casais heterossexuais inférteis, da mesma forma que manter o estado civil solteiro não serve de contraceptivo. E isto é assim desde sempre.
5) Portugal não é o único país do mundo. Existem mais, e nalguns deles o casamento entre pessoas do mesmo sexo é já uma realidade. Ou seja, o casamento no nosso mundo e no nosso tempo pode ser entre pessoas do mesmo sexo, por muitas aspas que lhe ponham. O casamento homossexual existe, sendo pouco relevante para o mundo se Portugal o legisle a par da Noruega ou se guarde para o fazer em simultâneo com Malta em 2037.
6) Dizer que a lei portuguesa actual não discrimina ninguém, porque afinal toda a gente pode casar, desde que com alguém de sexo diferente - li isto num
conhecido blog de esquerda - é o mesmo que dizer que a lei que proibia os casamentos inter-raciais na América não era discriminatória, dado que afinal toda a gente podia casar, desde que com alguém da mesma "raça".
7) O casamento entre pessoas do mesmo sexo não é uma distracção em relação à crise económica. Um ser humano normal é capaz de discutir, pensar e opinar sobre os mais diversos assuntos num espaço de tempo curto. Ainda mais se o faz como modo de vida, seja político ou jornalista. Não vale dizer que discutir o casamento homossexual nos impede de discutir assuntos mais prementes, para a seguir comentar - oh suma importância - o mais recente prémio Nobel ou a vestimenta da sra. Paulin. Com ou sem crise, a página do horóscopo continua a ser publicada nos jornais, o sudoku também.
8) Voltemos ao Connecticut, lá foi o tribunal a sentenciar o casamento entre pessoas do mesmo sexo: “To decide otherwise would require us to apply one set of constitutional principles to gay persons and another to all others.” Há quem diga, por cá, que isto de ser o tribunal a decidir significa que estes casamentos estão menos legitimados democraticamente que os outros. Expliquem portanto aos casais inter-raciais americanos o mesmo raciocínio, "o vosso camento vale um bocadinho menos que os outros, porque foi legalizado por um tribunal numa altura em que a maioria da população estaria contra".
Somando e baralhando. O PS foi cobarde? Foi. Deixou por cumprir mais uma promessa? Claro, estava no seu programa lutar contra a discriminação, e no final
subscreveu-a!!!
O "Prós&Prós" é o pior programa da televisão portuguesa? Não sei, havia um "Fiel ou Infiel?" muito mauzinho na TVI... E agora, o que vai acontecer? 3 hipóteses:
1) A minha favorita, até pelo efeito surpresa: o Tribunal Constitucional mostraria ao país que afinal não é um reflexo das agendas dos dois maiores partidos e faria aplicar a constituição do país, como lhe compete.
2) O PS aprova na próxima legislatura o casamento, o seu eleitorado é maioritariamente a favor, é incompreensível que o não faça.
3) O PS acobarda-se perante lóbis que não fazem parte do seu eleitorado e inventa uma união especial para gays e lésbicas. No BI na parte do estado civil passará a constar a abreviatura "pan." ou "fuf.", em vez do
tradicional "cas.". Como o casamento não é mero "capricho", como tanto se lê por aí, não faltará quem se sujeite à humilhação de um casamento-de-segunda para conseguir resolver vários problemas do dia-a-dia a dois. Depois, daqui a umas décadas, provavelmente por decreto de Bruxelas, transforma-se a tal união paneleira em casamento e pronto, manda-se uma carta aos noivos "
olhe, afinal a sua união vrrnhiec celebrada há 25 anos é um casamento, felicidades".