segunda-feira, setembro 03, 2007

Publijornalismo

Hoje ao minuto 5 do Jornal da Tarde da RTP surge um directo ao El Corte Inglés de Gaia, para uma reportagem sobre o preço do material escolar. Perguntava o jornalistaa dois clientes quanto lhes custava o uniforme do colégio do filho, os pais não sabiam, pergunta então ao porta-voz do centro comercial, existem vários preços, respondeu. O jornalista público, não satisfeito, insistiu por mais 3 vezes. Tratando-o sempre por "tu", o porta-voz do El Corte Inglés foi dizendo que dependia do colégio, dependia do tamanho e que simplesmente não sabia naquele momento quanto custaria. Tudo isto, repito, ao minuto 5 do noticiário das 13h do canal público de televisão.

Já durante o fim-de-semana foram intermináveis os directos a Gaia e Porto a propósito da Red Bull Air Race, prova que contava com o apoio da RTP. Abriu telejornais, ocupou-lhes o meio e encerrava-os. A Red Bull agradece, o contribuinte paga. O jornalismo público é então, afinal, apenas publijornalismo. Não se sabendo bem quando começa o jornalismo e acaba a publicidade ou vice-versa, e sobretudo, não se sabe bem onde andará a relevância dos acontecimentos noticiados.

Não há mal sem solução e no poupar é que está o ganho. Telejornais com um máximo de 30 minutos, directos apenas em situações tipo 9/11, e desporto num programa à parte, são 3 regras simples que fariam a inexistente qualidade actual da informação da TV pública disparar para níveis razoáveis.

30 minutos chegam perfeitamente para mostrar a actualidade nacional e internacional relevante (vejam-se os bastante mais curtos noticiários da Euronews) e sobra ainda tempo para uma entrevista ou reportagem mais alongada sobre um tema que mereça ser aprofundado.

Os directos que enxameiam os noticiários são regra geral minutos de dar dó. Jornalistas frustrados a tentarem entrevistar transeuntes relutantes, pessoas cujo café é interrompido para darem a sua opinião sobre a última contratação do Benfica ou estradas cujo trânsito de fim de férias se recusa a comparecer à hora do telejornal. Tudo triste, deprimente, sem qualquer acréscimo de informação útil, tudo escusado enfim.

Finalmente o desporto, esse império de marcas e publicidade, onde os exclusivos são conseguidos à custa de copyrights, deve estar completamente fora dos noticiários. Não é suposto o jornalismo ter que pagar para exercer, logo, o dito jornalismo desportivo é algo à parte, devia ficar à parte. Sem drama. Quando Portugal ganhar um campeonato do mundo e o pessoal encher as ruas de cachecóis e bandeiras, abra-se uma excepção, até lá, não.

6 comentários:

jpt disse...

Os meus preferidos são os directos de Bragança nos dias mais frios do ano, lá pra Janeiro. Os bragantinos, que, ao contrário dos jornalistas, têm um coeficiente de inteligência normal, mandam-nos geralmente dar uma curva. Exemplo:

-Então o senhor não acha que está muito frio?
-Naaa, é normal pra esta época do ano.
-e o que tem feito este ano para evitar o frio?
-o mesmo que faço todos os anos...
-....

(suspiro)

JPT

eduardo b. disse...

Não podia estar mais de acordo.

Vostradong disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Vostradong disse...

Concordo plenamete. Em Portugal, abusa-se do directo por tudo e por nada. No jornal da manhã da RTP o directo da Carla Trafaria é já uma rubrica. Por tudo e por nada, todos os dias, lá está ela, em directo da feira do boi em Alcochete, na festa da azeitona da Bobadela, e outras coisas assim... a entrevistar os presidentes das juntas e a terminar com "e vai ser assim, uma festa com muita cor, muita animação, muitos touros...". De rir para não chorar!...

Rodrigo

DE CORPO E ALMA disse...

Desde o final dos anos 80 quando me apercebi de como eram os noticiários nas televisões alemãs que me apercebi da porcaria, desculpem, não encontro outra palavra, que eram os telejornais portugueses. Horas a fio de notícias de encher chouriço. daí para cá só perdeu qualidade.
O jornalismo que se faz em Portugal deixa muito a desejar e não é só na televisão.

Isabela Figueiredo disse...

Então e os directos à entrada e saída da Ponte 25 de Abril, em inícios e finais de férias e feriados prolongados:
- Vamos agora para a praça da portagem onde se encontra a nossa repórter Carla Vanessa.
- Olá, boa tarde, o trânsito na ponte está normal, pelo que se deduz que os portugueses começam a organizar o regresso de férias mais cedo...
(Sempre o mesmo).

Outra coisinha: o uniforme do colégio das crianças, o uniforme do colégio das crianças... Isto está a caminhar para uma situação em que qualquer dia, na escola pública, só andam os indigentes... e os meus filhos, claro (bem, quando os tiver).