Nota prévia: o editorial que se segue não é do Correio da Manhã
«Num dia em que voltaram a levantar todas as teorias sobre o destino de Madeleine, a criança inglesa desaparecida no Algarve há mais de quatro meses; duas semanas depois de terem sido mortos a tiro empresários e seguranças da noite de Lisboa e Porto; após uma semana de assaltos à mão armada (bancos, carrinhas de valores e, ainda ontem, uma ourivesaria), que também fizeram vítimas; não podia ter sido mais inoportuno da parte do Governo anunciar os números da criminalidade e dar destaque à diminuição do crime violento.»Inoportuno para quem? Só se for para quem se dedica a explorar o crime, fazendo sensacionalismo diário com casos relativamente isolados e que as estatísticas não se cansam de demonstrar serem em muito menor número em Portugal do que na maioria dos países europeus.
«Primeiro porque são números que dizem respeito apenas aos primeiros seis meses do ano, ou seja, até Junho. E que, seguramente, os factos de Julho, Agosto e este agitado início de Setembro vão fazer disparar. Depois porque dá a ideia de que a indicação dada às forças de segurança é a de encarar os últimos casos com normalidade.»Irão fazer disparar? Se até o caso Madeleine, ocorrido em Maio, teve que ir buscar para a lista!? E a polícia deve encarar o crime como? Histericamente resultará melhor? Do que encarar com profissionalismo, como é suposto fazerem-no todos os dias, já que diariamente é esse o seu trabalho, combater o crime?
«Quando os factos contrariam os números, não há percentagens ou décimas tranquilizadoras. O que descansaria os portugueses era ver os últimos acontecimentos tratados como excepções: pelas forças de segurança e pelo Governo. Para não temerem que a violência generalizada esteja a instalar-se no País. Para poderem continuar a achar que se trata apenas de casos pontuais.»É óbvio que não há estatística que valha a quem acabou de ser vítima de um crime. A probabilidade de nos cair um raio em cima da cabeça é desprezável de tão baixa, mas um dia que caia, de nada nos irá valer a ínfima probabilidade. O histerismo e indignação são perfeitamente compreensíveis e justificáveis vindos da boca de alguém que acabou de ser assaltado. No editorial de um jornal que se diz de referência é apenas histérico e sensacionalista.
Os factos não contrariam os números, até porque estes se limitam a contabilizar os factos. É o exagerado destaque dado a factos isolados e o nulo destaque dado à regra (ainda ontem ouvi um agente da PSP explicar que há 2 anos que não havia um assalto à mão armada em Viana do Castelo) que criam sentimentos colectivos de insegurança, sem qualquer correspondência com a realidade, mas apenas com as manchetes dos tablóides (editorial do DN incluído no lote).
Não é demais recordar: «Segundo o professor [Cândido Agra, presidente da Sociedade Portuguesa de Criminologia], Portugal é um país com medo. Ao estudar a insegurança deparou-se com um paradoxo ao mesmo tempo que Portugal é o país com o menor índice de criminalidade da União Europeia, por outro lado, é o "mais medroso", caracterizou o professor.» Isto interessa a quem? Não tem já o país problemas de sobra para se andar a deprimir com os que não tem?
5 comentários:
Muito bem!
Faz bem encontrar bom senso "impresso" (é num monito, não é impresso, but who cares?)
é que o medo não só vende jornais mas mantem as pessoas em casinha a mamarem tudo o que é telelixo com anúncios (muitos) pelo meio.
na mouche dr maybe, e também calha bem para uma certa agenda de extrema-direita..
havia outro estudo engraçado, que não tive tempo de procurar, sobre a criminalidade nas capitais europeias, e se bem me lembro, Lisboa era a que tinha menos crimes, mas mais alarmes nas casas.. Londres era o oposto, mais crimes e menos alarmes. Também se diz que lá o pessoal anda mais satisfeito com a vida.. e isto anda tudo ligado.
Perito defende informação contra sentimento de insegurança
http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=13&id_news=294102
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