quarta-feira, novembro 21, 2007

A democracia espanhola

Parece que o que está a dar agora pelo mundo da bloga tuga é discutir a democracia venezuelana. Tudo bem, é capaz de ser giro, mas eu confesso-me demasiado distante e desinformado dessa realidade. Vai daí, apetece-me antes discutir a democracia aqui do lado.

Relembremos alguns factos históricos. O chefe de estado espanhol é-o desde 1975, sem nunca ter ido a eleições, e foi indicado por Franco, o ditador sanguinário que o precedeu. Antes que alguém venha comentar do referendo, relembro que isso aconteceu depois, já o Juanito era rei, e o referendo não foi sobre a monarquia, mas sobre a constituição, que entre outras coisas, aceitava a monarquia já reinstalada. Bom, isto é história, falemos de factos mais recentes.

A revista "El Jueves" foi retirada dos quiosques espanhóis por ordem da justiça, que considerava a capa criminosa. Além da censura imediata à revista, recentemente a mesma foi condenada ao pagamento de multas. A razão de tudo isto foi um cartoon sobre a única obrigação do príncipe herdeiro (gerar mais herdeiros) que ilustrava a dita.

Falando nos príncipes, no ano passado, dois republicanos foram agredidos pela polícia e passaram a noite na cadeia por, na presença das altezas, terem gritado "Viva a República!" e agitado bandeiras republicanas.

Entretanto no País Basco mil e uma confusões. Partidos proibidos, dirigentes desses mesmos partidos presos (sem que tenha sido provado qualquer acto de violência cometido pelos mesmos), até uma vila que com meros 27 votos é entregue ao PP - já que a oposição foi impedida participar na eleição. Mais recentemente o líder do governo autonómico propôs um referendo sobre a independência do basco país, proposta prontamente rejeitada pelos partidos dominantes em Espanha - "é ilegal", justificaram, e mais ameaçaram com perdas de autonomia.

Entretanto sai a condenação de 2 jovens de Barcelona que queimaram uma foto do rei, 2730 euros cada um e um cadastro manchado. Durante o julgamento os dois jovens falaram em catalão, língua que o juiz rejeitou de imediato: "un ciudadano español de 30 años conoce y entiende perfectamente el español con lo que no a lugar a un traductor". Assim as suas declarações não foram registadas, nem tidas em conta no julgamento. Já esta noite mais cerca de 60 pessoas queimaram fotos do rei na cidade durante mais uma "manifestação ilegal".

Bom e que nos diz isto tudo? Que a democracia espanhola, como todas as outras, está longe de ser perfeita. Tem mesmo leis profundamente anti-democráticas. E objectivamente existem presos e condenados políticos em Espanha. Mas, mesmo assim, e sobretudo tendo em conta a situação da maioria dos regimes em vigor no planeta, é uma democracia. Mas não é impossível argumentar o contrário. Ser republicano ou independentista catalão, basco ou galego, p. ex., exige uma enorme paciência e auto-contenção face a todos os obstáculos legais à promoção desses mesmos ideais políticos.

Pronto, já desenjoei de todo o paternalismo colonialista pseudo-democrático que se lê por aí nestes dias... sem que se tenha metade do zelo com regimes que nos estão muito mais próximos. A última vez que vi tanta gente preocupada com a democracia de uma república longínqua, deu no que deu...

1 comentário:

Anónimo disse...

Outro défice da democracia española. Vin online parte da programa da Fátima Campos sobre Chávez. Os "depoimentos" do señor ese de La Razón e dalgún convidado máis foron feitos en castelán. Aquí sería absolutamente impensábel que un xornalista portugués se expresase en portugués no noso Prós&Contras sen traducción simultánea. De inmediato, a directora da RTVE recibiría centenas de millares de denuncias de indignados televidentes e se cadra, algún que outro pedido de dimisión tamén.
Claro que agora que o penso, probablemente calquera xornalista portugués, se for convidado a un programa en directo da TVE (feito altamente improbábel) se expresaría en castelán ou no mínimo, en portunhol.