Mais uma prenda para o PS
Depois da Opus Dei, perdão, Gay, é a vez da Universidade Católica. O Miguel diz praticamente tudo o que há a dizer, mas não resisto a dar mais algumas achegas.
Comecemos pelo princípio: «Portugueses ainda perfilham moral tradicionalista» titula o Público, para logo se ler «Legalização da prostituição, eutanásia activa a pedido de doente incurável ou com doença dolorosa, introdução do sacerdócio feminino. Eis algumas causas fracturantes que, mesmo não estando actualmente na agenda política, recebem apoio maioritário dos portugueses, de acordo com uma sondagem da Universidade Católica (...)». Eh lá, é isto a moral tradicionalista afinal? E a sondagem deu para meter isto tudo numa só? E "fracturantes" já nem leva aspas, repararam?
Imagino a confusão que terá sido o telefonema de quem respondeu à sondagem. (Ainda há pouco tive o azar de levar com uma sobre telemóveis que prometia ser curta, e nunca mais acabava, estas sumarentas nunca me calham, raios!) E como se a confusão de temas não fosse por si só suficiente para enviesar os resultados, ainda há a parte do "podia responder a umas perguntinhas duma sondagem p'ra Católica?", que inibe qualquer devoto a dizer o que realmente lhe vai na alma.
Mas vamos imaginar que a sondagem correspondia à realidade, nela não veríamos grandes diferenças (no que toca ao casamento entre pessoas do mesmo sexo) face à única outra sondagem que conheço sobre o tema feita no país, a da Aximage de 2004. Embora nesta as alternativas fossem casamento (35,3%) ou não-casamento (53,8%). E nestas coisas de sondagens sobre temas que não estão em "campanha eleitoral" o modo como é feita a pergunta e as hipóteses dadas podem ser a diferença entre 30 ou 60%. Porque o que as pessoas querem é despachar o telefonema, e seguirem com os seus afazeres. Mas supondo então que a coisa pouco ou nada tinha mudado, excepto, de acordo com a Católica, nas camadas mais jovens, com grande aceitação quer do casamento, quer da adopção por casais homossexuais. Porque não "mudaram as mentalidades" nestes 2 anos? Porque não são os resultados semelhantes ao das sondagens espanholas?
Parece-me fácil a resposta, por culpa do PS! As associações LGBT, os blogs, os artigos de jornal, podem e têm feito muita coisa, mas o seu alvo é necessariamente limitado. O que falta no país é um discurso político mainstream pró-casamento, claro e convincente, e isso, só o PS está em condições de dar. E que faz o PS? Fica embaraçado se lhe perguntam do tema, adia, dá o dito por não dito, patrocina "activistas gay" que não querem casamento... Esta sondagem, que é um óptimo presente e desculpa para o PS adiar ainda mais as suas envergonhadas promessas, é da sua absoluta culpa. O que o PS devia pensar é que se sem mesmo nada fazer as "mentalidades" já estão assim, seria tão fácil contribuir para "mudanças" mais alargadas...
Comecemos pelo princípio: «Portugueses ainda perfilham moral tradicionalista» titula o Público, para logo se ler «Legalização da prostituição, eutanásia activa a pedido de doente incurável ou com doença dolorosa, introdução do sacerdócio feminino. Eis algumas causas fracturantes que, mesmo não estando actualmente na agenda política, recebem apoio maioritário dos portugueses, de acordo com uma sondagem da Universidade Católica (...)». Eh lá, é isto a moral tradicionalista afinal? E a sondagem deu para meter isto tudo numa só? E "fracturantes" já nem leva aspas, repararam?
Imagino a confusão que terá sido o telefonema de quem respondeu à sondagem. (Ainda há pouco tive o azar de levar com uma sobre telemóveis que prometia ser curta, e nunca mais acabava, estas sumarentas nunca me calham, raios!) E como se a confusão de temas não fosse por si só suficiente para enviesar os resultados, ainda há a parte do "podia responder a umas perguntinhas duma sondagem p'ra Católica?", que inibe qualquer devoto a dizer o que realmente lhe vai na alma.
Mas vamos imaginar que a sondagem correspondia à realidade, nela não veríamos grandes diferenças (no que toca ao casamento entre pessoas do mesmo sexo) face à única outra sondagem que conheço sobre o tema feita no país, a da Aximage de 2004. Embora nesta as alternativas fossem casamento (35,3%) ou não-casamento (53,8%). E nestas coisas de sondagens sobre temas que não estão em "campanha eleitoral" o modo como é feita a pergunta e as hipóteses dadas podem ser a diferença entre 30 ou 60%. Porque o que as pessoas querem é despachar o telefonema, e seguirem com os seus afazeres. Mas supondo então que a coisa pouco ou nada tinha mudado, excepto, de acordo com a Católica, nas camadas mais jovens, com grande aceitação quer do casamento, quer da adopção por casais homossexuais. Porque não "mudaram as mentalidades" nestes 2 anos? Porque não são os resultados semelhantes ao das sondagens espanholas?
Parece-me fácil a resposta, por culpa do PS! As associações LGBT, os blogs, os artigos de jornal, podem e têm feito muita coisa, mas o seu alvo é necessariamente limitado. O que falta no país é um discurso político mainstream pró-casamento, claro e convincente, e isso, só o PS está em condições de dar. E que faz o PS? Fica embaraçado se lhe perguntam do tema, adia, dá o dito por não dito, patrocina "activistas gay" que não querem casamento... Esta sondagem, que é um óptimo presente e desculpa para o PS adiar ainda mais as suas envergonhadas promessas, é da sua absoluta culpa. O que o PS devia pensar é que se sem mesmo nada fazer as "mentalidades" já estão assim, seria tão fácil contribuir para "mudanças" mais alargadas...
2 comentários:
É claro que eu tenho uma opinião sobre qualquer assunto, como qualquer cabecinha pensadora. É claro que posso exprimir essa opinião. É claro que muita gente não está interessada em ouvi-la.
Hoje vi no telejornal uma sondagem sobre o que pensavam os portugueses sobre eutanásia, prostituição, casamento e adopção por casais homossexuais...
Mas o que têm as pessoas a ver com isso?
Vai haver um referendo sobre o aborto, onde os eleitores serão chamados. Eu serei chamado para dar a minha opinião. E tenho a minha opinião.
Mas a realidade é que, após ter pensado muito sobre o assunto, a minha conclusão é:
O que raio tenho eu a ver com isto? Eu não sou mulher, nem nunca vou engravidar, não faço a mínima ideia de como é sentir-se na pele de alguém que quer ser mãe, ou não quer ser mãe, do que me pode levar a querer fazer um aborto ou não. Como raio posso eu estar a dar uma opinião, que para todos os efeitos é vinculativa e tem peso na matéria (como a de qualquer eleitor que for votar), sobre algo que, em última análise, não me diz minimamente respeito?
É como perguntarem à senhora provinciana, do campo, de 70 anos, casada há quarenta, se acha bem o casamento homossexual. Que tem ela a ver com isso? Nunca foi homossexual, provavelmente nunca viu nenhum, não conhece a sua realidade, como raio há-de ter uma opinião sobre o assunto?
Acham que faz sentido perguntar ao vosso carteiro se devem realmente ter um edredon amarelo na cama? Que tem ele a ver com isso ou que percebe do assunto?
Ok, redução ao absurdo, mas acho que já entenderam o meu ponto: quando se chamam os Portugueses para dar opiniões sobre factos que a maioria não pode opinar (ou não deve) porque não tem conhecimento do assunto ou não tem nada a ver com isso, algo de errado se passa. A solução deveria partir por outro lado.
Pois, as estatísticas sempre foram usadas como estratégia de governamentalidade. E são uma optima maneira de criar e reforçar a separação fictícia entre "nós" e "eles", os tais dos vícios, porque "nós" seremos sempre os das virtudes. De facto, uma coisa é perguntarem-me se eu sou contra o aborto, e eu dar uma resposta cheia de moralismo sonso e do tal "direito à vida", outra coisa, é perguntarem-me se eu, tendo uma gravidez indesejada, acho que deveria ter o direito de abortar legalmente e com condições de saúde, ou se preferia ir presa, ou ter na mesma a criança. Uma coisa é perguntar à tal senhora do campo se ela é a favor do casamento dos tais homossexuais (os tais "outros"), outra é se por acaso ela tivesse uma filha lésbica, se gostaria que ela fosse discriminada por não ter uma existencia jurídica.
É claro que agora vamos todos poder dizer que "os portugueses são a favor disto e contra aquilo", mas fica a questão: quem são esses portugueses? serei eu? será o meu vizinho? mas eu não ando a dizer o que deev fazer o meu vizinho? e a felicidade individual de cada um?
Assim se governa o conhecimento social, assim se criam as narrativas que podem (ou não) oprimir a vida de cada um.
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