sábado, janeiro 13, 2007

RTP: Jornalismo abortado

Não, não vou repetir as minhas queixas pela campanha diária pelo Não do Padre Borga nas manhãs da RTP1 ou da campanha igualmente diária da ICAR nas tardes da RTP2. É mesmo do Jornal da Tarde que vos falo.

Na 5ª feira houve apenas espaço para o Não, uma conferência de uma qualquer sotaina em campanha por Vale de Cambra valeu uma notícia, no Sim nada lhes importou. Na 6ª feira as coisas foram mais equitativas no tempo, ou talvez não. Depois de uma entrevista a uma jovem que já abortou em condições de clandestinidade seguiu-se a de uma mão adolescente a quem "nunca passou pela cabeça abortar". Ora se nunca lhe passou pela cabeça abortar que raio de interesse poderá ter a sua estória em relação ao que se discute agora? Afinal nada de diferente se teria passado em relação ao seu caso particular, fosse legal ou ilegal abortar. Finalmente hoje, mais uma homilia de Fátima, entrevistas de rua aos crentes, e pelo Sim? Apenas o anúncio que Jorge Coelho ia lançar a campanha do PS.

Mas fosse só este claro favorecimento de tempo de antena ao Não. O favorecimento ao Não na RTP é a todos os níveis, e começa logo na apresentação do tema: "referendo ao aborto". Mas referendo ao aborto de quem? Da ética jornalista no serviço público? Parece-me abortada há muito. Aborto da RTP? Aborte-se então. Como já escrevi aqui, "referendo ao aborto" não pode ser tolerado como um resumo de "referendo à despenalização da IVG". Não é a mesma coisa. Dizer "referendo ao aborto" é entrar na lógica do Não. Não é jornalismo, é distorção e manipulação. Tal como falar em "movimentos contra e a favor do aborto", já perdi a conta às vezes que ouvi isto na RTP! E como se não bastasse usam um feto de não sei quantos meses como grafismo para o tema, ao invés de um isentíssimo boletim de voto ou martelo da justiça, ou seja, aquilo que afinal se discute. Televisão pública assim mais vale abortar de vez. É isso mesmo que vou dizer ao Provedor.

8 comentários:

DE CORPO E ALMA disse...

O jornalismo que se faz em Portugal não prima pela precisão dos termos que usa. Fala-se muito à moda do povo, generalista e descuidada, concorrendo para a distorção da informação. Será esta prática voluntária ou de puro desleixo? Qualquer que seja a razão não se presta um bom serviço ao país falar de alhos e dar a entender bugalhos.

Manel disse...

Sem falar que os tempos de antena há muito que começaram, há dias apanhei meia-hora de campanha no programa Ecclesia, na RTP2. É a democracia portuguesa em todo o seu esplendor.

/me disse...

Mas usar "IVG" é entrar na lógica do sim. A palavra "interrupção" é muito contestada, porque dá a ideia de que será algo que pode vir a ser retomado. Poderia ser "Término voluntário da gravidez" ou algo assim.

bossito disse...

/me mas a questão não é essa, digam "aborto" à vontade, é o que eu uso nas tags.. Agora não digam que é um referendo "ao aborto", é isso que não entendo. O que se referenda é a despenalização de quem aborta, o aborto é alheio a penalizações, e vai continuar a existir ganhe o sim ou ganhe o não, não é uma realidade nova como sugere a ideia do "ser contra ou favor"..


Manel, tudo com os nossos impostos, é para o que servem...

Génio Louro disse...

Ridícula a cobertura informativa. Genial o post. Espero que não te importes mas não resisti a colocar no meu blog. Os créditos estão lá, claro!

/me disse...

Desculpa, tens razão.

B. César disse...

Temos que entender que a comunicação social está minada por pessoas de direita ligadas à igeja e em quanto isso não mudar não há nada a fazer. Apenas temos que ter uma atitude crítica quando as coisas acontecem e não embarcar na conversa que nos querem impingir.

bossito disse...

No Jornal da Tarde de ontem mais uma vez só houve tempo de antena para o Não, a "feliz" comparação do bispo de Bragança entre o aborto e a pena de morte... Já faltam poucos bispos para o serviço público fazer o pleno das dioceses, uma por dia...